Há muito que a ciência comprovou os benefícios gerais da atividade física, recomendada como ingrediente de uma vida que se quer saudável. É assim para quem nada sofre e deveria ser também assim para quem vive com diabetes. 1,2 Susana Bastos Heitor, assistente hospitalar graduada de Medicina Interna no Hospital Prof Doutor Fernando Fonseca, explica que “quando falamos de uma doença crónica, como a diabetes, em que o defeito de base se trata da incapacidade do organismo resolver a gestão do excesso de glucose no sangue, a insulinorresistência, faz todo o sentido apostar no exercício físico como forma de tratamento”. 1,2 É para este e outros hábitos saudáveis que alerta também o mais recente episódio da série “O Casal”, que acompanha a relação da Maria Diabetes e do Zé Coração.
Apesar de, no geral, os portugueses estarem conscientes destes benefícios, ainda são muito os que se ficam pela teoria, ignorando a prática. “A questão fundamental é se passam da ideia vaga de que é preciso fazer exercício para a concretização desse exercício como parte integrante da sua vida”, confirma a médica, que assegura que “muitas destas pessoas nunca praticaram exercício físico, ou têm outras patologias associadas, como dor osteoarticular, ou receiam por ter patologia cardíaca”. Mas, garante, “o exercício físico consegue ter impacto equivalente ou superior à medicação e funciona sempre como um adjuvante da terapêutica para a diabetes. 1,2 E esta noção do impacto positivo que pode representar na diabetes, e na boa relação entre o coração e a diabetes, não é devidamente valorizada”.
É, por isso, importante saber que a prática de exercício, que faz ativar os músculos, “diminui a insulinorresistência, contribuindo para um melhor controlo da doença”. Mais ainda, “nas fases precoces da diabetes, perder peso e manter a prática regular de exercício permitem a reversão da doença, ou pelo menos atraso no seu início”. 1
Por isso, a especialista defende, à semelhança do que acontece noutros países, uma verdadeira prescrição de exercício como tratamento, “a única forma de generalizar, de forma eficaz, sem desculpas, a prática de exercício físico, como parte integrante da terapêutica para a diabetes”.
E se o exercício é importante, não menos importante para o controlo da doença, única forma de evitar as complicações - uma vez que, reforça a especialista, “só a diabetes descompensada é que irá degenerar em complicações” - é a alimentação, que se quer saudável e que, tal como o exercício físico, deve tornar-se rotina. 1,2
Aqui, para o doente com diabetes, tal como para a restante população, a variedade deve ser a regra. “Legumes e verduras são obrigatórios e podem ser consumidos à vontade; a sopa (feita com pouca ou nenhuma batata) é um alimento saudável e saciante; a fruta deve ser consumida de forma equilibrada, não ultrapassando as três peças por dia; as proteínas devem também consumidas de forma equilibrada e variada, com o cuidado de não ingerir mais de 100 g de proteína a cada refeição”, refere Susana Bastos Heitor.
Quanto aos hidratos de carbono de absorção lenta, como massa, arroz, batata, “devem ser consumidos com moderação a cada refeição (duas colheres de sopa de arroz ou massa ou uma batata média)”. Já as leguminosas (feijão, grão, ervilhas, favas), “além de conterem hidratos de carbono, também possuem bom teor de proteína vegetal, podendo e devendo ser consumidas, mas com moderação (para os consumir não é obrigatório fazer feijoada ou favada com os enchidos). A gordura preferencial é o azeite, mas também com moderação”, refere a médica, que salienta ainda a importância da hidratação - cerca de 1,5 litros de água por dia. Bebidas alcoólicas, só com muita moderação e, “sempre muita contenção, o consumo de sal, dando privilégio às ervas aromáticas”. Finalmente, importa “recordar que somos um país Mediterrânico, cuja dieta é considerada a mais saudável e equilibrada”. 1,2
A isto junta-se a necessidade de acabar, de uma vez por todas, com um dos grandes mitos associados a esta doença, o de que existem alimentos e dietas para diabéticos. “Todas as pessoas devem ter uma alimentação equilibrada, como aquela que é indicada para o bom controlo da diabetes. Os alimentos proibidos para a diabetes também o são para todas as pessoas e só devem ser consumidos pontualmente, nos dias ditos de festa. Doces, fritos, comidas processadas, com alto teor de sal, não fazem parte de uma alimentação equilibrada. Não é obrigatório comer sempre ‘cozidos e grelhados’, que podem ser consumidos de forma intercalada com alimentos estufados ou assados no forno.” Até porque, “as dietas monótonas são rapidamente interrompidas”.
Controlar a diabetes passa também pela medicação instituída, “fundamental, e atualmente temos excelentes fármacos disponíveis, tanto orais, como injetáveis. Mas, o mais importante deve ser a consciência de que a própria pessoa é o elemento principal e mais capacitado para o sucesso no combate à diabetes. Na verdade, se a pessoa com diabetes mantiver a sua doença adequadamente tratada, assim como de outras doenças crónicas, igualmente silenciosas, como a hipertensão arterial e a dislipidémia, vai manter a sua qualidade de vida ao longo dos anos”. 1
Até porque, defende a médica, “a diabetes é a doença do equilíbrio. Equilíbrio a comer, equilíbrio no exercício, equilíbrio e compromisso na gestão da vida de modo global. Dormir bem, descansar o suficiente. E mesmo que seja difícil a mudança inicial, está dentro de cada um a capacidade de introduzir pequenas alterações e, de forma progressiva, atingir metas de exercício e hábitos alimentares saudáveis. Como em tudo, o esforço, o investimento e o cuidado fazem parte da aprendizagem”.
É este, de resto, o tema de mais um episódio da campanha lançada pela Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal, do Núcleo de Estudos de Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, da Sociedade Portuguesa de Diabetologia e da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia Diabetes e Metabolismo, com o apoio da AstraZeneca, que visa chamar a atenção para as relações perigosas que se estabelecem entre a diabetes e outras doenças.
Para isso, Maria Diabetes e Zé Coração partilham a sua relação, que espelha a que existe entre a diabetes e o risco cardiovascular, disponível em mais um episódio, o 2º. O 3.º será apresentado no âmbito do Dia Europeu da Insuficiência Cardíaca e o 4.º no âmbito do Dia Mundial do Médico de Família.
Fontes bibliográficas
- American Diabetes Association Diabetes Care 2020 Jan; 43 (Supplement 1): S37S47. https://doi.org/10.2337/dc20-S004
- American Diabetes AssociationDiabetes Care 2020 Jan; 43 (Supplement 1): S48-S65. https://doi.org/10.2337/dc20-S005